Livro das derrapadas no marketing
O mundo do marketing e da propaganda no Brasil tem o péssimo costume de ser essencialmente auto-laudatório e badalativo. As vaidades e os interesses comerciais e de carreira impedem que se reconheçam publicamente os erros, mesmo aqueles que internamente chegam a provocar de puxões de orelha a demissões de executivos.
Isto explica (mas não justifica) porque tão raramente aparecem comentários críticos sobre marketing ou propaganda na nossa imprensa (com gloriosas exceções, como a do jornal PropMark, que publicou minha coluna).
Ora, nos Estados Unidos, pátria do marketing, isto não é assim. Críticos do marketing e da propaganda escrevem em diversos veículos, e o mais famoso desses críticos foi Herschell Gordon Lewis (falecido em 2016), cujo brilhante livro Marketing Mutilado tive a satisfação de traduzir e editar no Brasil.
Por isso, um profissional de marketing americano que leia português (se é que existe algum) e acompanhe a maioria das nossas revistas e jornais irá pensar que todas as empresas e agências de propaganda do Brasil são perfeitas e que todos os seus profissionais são gênios que nunca erram, pois só se fala nos prêmios que ganharam e nas contas que conquistaram. Quando uma conta troca de agência, é porque houve “reposicionamento estratégico”, ou por “alinhamento”, nunca porque algo não estava dando certo.
Com a coluna Derrapadas minha intenção foi preencher essa lacuna no Brasil. Pois, em meu entendimento, nada melhor do que a crítica e a discussão dos cases que apresentam falhas para melhorar a performance dos profissionais do nosso mercado de uma forma realmente séria e para aperfeiçoar os próprios procedimentos das empresas.
É através da apresentação e discussão dos erros que melhor se aprende como evitá-los e como fazer as coisas certo.
Desde meados de 2005 até 2008, no jornal PropMark apresentei, a cada duas semanas, um novo case de Derrapada, seja com base em experiências e observações pessoais minhas, seja com base em colaborações espontâneas de profissionais do mercado à minha coluna. Reproduzi-as em meu site derrrapadas.com.br, posteriormente desativado.
Meu desejo e meu objetivo foi (e ainda é) que todos nós aprendamos muito com os erros alheios, para procurar reduzir ao máximo os nossos… pois ninguém (nem mesmo o colunista) pode se considerar previamente vacinado contra derrapadas.
A receptividade extremamente positiva dos leitores à minha coluna nestes três anos, com meus textos sendo lidos, aproveitados e estudados tanto por profissionais quanto por estudantes de marketing, propaganda e administração de faculdades de todo país, demonstra que eu estava no caminho certo. Tão grande foi o interesse na abordagem da minha coluna que no início do ano letivo de 2010 eu fui convidado para proferir a palestra inaugural dos cursos de graduação da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), em São Paulo, sob o título “Aprendendo a fazer certo com os erros, dos outros” na qual apresentei alguns dos cases de derrapadas mais emblemáticos.
Agora, passados 13 anos, e para atender ao pedido de muitos estudantes e mesmo de profissionais que não tiveram a oportunidade de ler todas as colunas publicadas, por sugestão do então Presidente da ESPM, José Roberto Whitaker Penteado, concordei em editá-las neste livro, reproduzido aqui no formato virtual. E quem não leu ainda nenhuma delas terá neste livro um retrato das bobagens e espertezas que se faziam (e muitas ainda se fazem) em nome do marketing e da propaganda em nosso país – e espero que assim fique “vacinado” para não cometer outras iguais ou semelhantes.
Claro que muitos dos casos relatados são ”datados”, ou seja, precisam ser entendidos dentro do contexto social, político e mercadológico brasileiro do início do milênio… Contexto este que não levava em conta ainda as visões de duas décadas depois sobre respeito a raça, gênero, etarismo e outros conceitos ligados ao ambientalismo e outros “ismos”. Se os casos apresentados e criticados em minhas colunas fossem abordados hoje por mim, certamente eu incluiria outras críticas. Mas as críticas feitas então por mim continuam válidas e, observador a atento que sou do marketing e da propaganda, tenho notado que muitas empresas e muitas agências de comunicação e marketing, embora hoje em dia mais “cuidadosas” com o respeito ao consumidor, continuam derrapando com frequência e, em alguns casos, apenas de forma mais tecnológica ou sofisticada. As derrapadas atuais passaram a ser mais ’digitais” mas nem por isso menos derrapantes… Por vezes até mais…