Livro das derrapadas no marketing
Sábado passado eu pretendia dormir até mais tarde, mas fui acordado por um telefonema… de alguém de um banco, vendendo alguma coisa (não vou dizer qual era o banco, pois esta doença não é específica, já virou epidemia). Minha resposta padrão a essas abordagens é: “Eu não aceito propostas por telefone, pois não sei com quem estou falando e além disso estou ocupado. Se vocês têm uma proposta a fazer e sabem quem eu sou, me mandem por carta ou por email.”
Em 1991 eu fiz uma pesquisa para a ABEMD, sobre a receptividade às diversas mídias utilizadas pelo marketing direto. O telemarketing ativo (aquele que liga da empresa para o consumidor) se revelou então a seus olhos como a mais invasiva, a mais indesejável de todas as abordagens. As mais bem aceitas foram a mala direta e os jornais. O telemarketing foi o primeiro colocado em desconfiança, em irritação, em “invasão da privacidade” e o último colocado como gerador de desejo de compra. Ou seja, a mídia mais mal vista pelo consumidor e a menos propensa a trazer bons resultados. Sem falar no prejuízo de imagem que traz para as empresas que a utilizam, que ficam associadas à agressividade desta mídia.
Por que então as empresas insistem tanto em incomodar os consumidores em suas casas ou interromper o seu trabalho, para lhes fazer ofertas agressivas de vendas, geralmente por vendedoras mal preparadas, que despejam um discurso decorado em cima do interlocutor?
A resposta está em dois fatores negativos e um positivo: Os negativos são: 1) a visão de curto prazo de certos profissionais, que buscam resultados imediatos, a qualquer custo, ainda que este seja o da destruição da imagem da empresa; 2) a ganância de certos gigantes das telecomunicações que entraram também neste ramo, já que o custo da telefonia, para eles, é igual a zero. E o fator positivo é a sorte de não termos tido ainda entre nós uma legislação severa, como em alguns estados americanos, simplesmente proibindo ou restringindo brutalmente esta atividade.
Não advogo de modo algum pela intervenção governamental nesta área, como aliás em nenhuma outra, já que a liberdade das comunicações é o mais importante atributo da democracia. Argumento simplesmente pela lógica da eficiência, pois uma forma de abordagem que desagrada profundamente ao consumidor, ainda que possa produzir resultados positivos em vendas a curto prazo (certamente por serem vendas sob pressão, quando não por enganação) com certeza traz resultados muito negativos a médio e longo prazo para a empresa e para a marca.
Nesses últimos 15 anos a ABEMD nunca atualizou esta pesquisa, apesar de vários apelos meus neste sentido. Isto seria utilíssimo agora, como subsídio às empresas que insistem em utilizar esta artilharia pesada contra o consumidor, e também para avaliar a penetração e a aceitação de uma mídia inexistente na época, o email. Sou capaz de apostar que a irritação com o telemarketing ativo só deve ter crescido e que aquela com a mala direta só deve ter decrescido, até mesmo porque, devido ao aumento brutal dos custos do correio, hoje se faz proporcionalmente menos mala direta do que naquela época. E também porque, sem dúvida, uma boa parte das malas diretas foi substituída pelo email marketing, apesar de este ser tão demonizado e pichado de “spam”.
Numa nova pesquisa, qual será a reação do consumidor brasileiro diante do email em si mesmo e quando comparado com outras mídias, em especial com o telemarketing? Sou capaz de apostar também que teremos para o email um quadro semelhante ao que observamos em relação à mala direta naquela pesquisa da ABEMD.
Observamos então que os indivíduos que rejeitavam a mala direta (menos de 5%), alegando que recebiam muitas “malas-lixo” e jogavam tudo fora, faziam essas afirmações apenas por esnobismo, para se mostrarem “superiores”, sem conseguirem esconder um certo orgulho por figurarem em tantos mailings e receberem tantas malas… Na verdade, esses pseudo-incomodados também abriam as malas diretas que interessavam, quando não todas as que recebiam…
Pesquisas mais recentes, feitas por outras entidades, embora com metodologias diferentes, já indicam resultados semelhantes para o email. Ou seja, uma ampla aceitação das mensagens chegadas por esta mídia, desde que adequadas aos interesses de cada um e provenientes de origens respeitadas.
Em novas pesquisas certamente deve aparecer também uma minoria de consumidores “incomodados”, rejeitando o email em nome do “spam”, como é considerado “politicamente correto” devido à tão difundida e repressiva ideologia que, sintomaticamente, criminaliza o email marketing e poupa o telemarketing (afinal, as poderosas telefônicas e seus provedores querem que se use o telefone como mídia, não o e-email…).
Quanto ao telemarketing, não tenho dúvidas do que deve revelar uma nova pesquisa, se feita com isenção: ao contrário do que acontece com a mala direta, o email e todas as demais mídias, ainda que o produto e a oferta feitas por telemarketing possam interessar ao consumidor, a forma de abordá-los é tão agressiva e invasiva, que o tiro sai pela culatra: a rejeição deve ser geral. Repito então o meu apelo: pessoal, parem de derrapar no lodaçal do telemarketing ativo! Botem o dinheiro no receptivo, para melhorar o atendimento nos seus callcenters, que eles estão precisando, e muito. E se sobrar algum, botem no email, na mala direta e nos jornais!