Livro das derrapadas no marketing

Telemar não quer clientes telefonando!
Colunista: Antonio Silvio Lefèvre – Edição 04/09/2006

A leitora carioca Jana de Paula me escreveu: A Telemar está cobrando R$ 1,63 por cada telefone informado no serviço 102, de auxílio à lista. Se você quiser dois ou três números terá que pagar o dobro ou o triplo. Acho que tem uma derrapada aí.

Sem conseguir acreditar no que seria não uma simples derrapada mas uma super, uma imensa derrapada, pedi a ela que se certificasse de que não havia engano, antes de botar a boca no trombone.

Por incrível que pareça, é verdade mesmo, me confirmou ela. Mesmo o pedido do número da central de atendimento ao cliente – de reconhecimento de voz – é cobrado. Ou seja, se eu tiver alguma reclamação ou pedido e precisar do número (10331) e não souber, terei que pagar R$ 1,63 para sabê-lo. Em alguns minutos, só com pedidos de informação, gastei R$ 4,89!.

E eu que achava que dificilmente apareceria uma derrapada capaz de concorrer com aquela do Itaú que cobra R$ 1,05 para depositar cada cheque lá… o que motivou a minha coluna “O Itaú não quer o seu dinheiro”.

Definitivamente, o clube dos derrapantes vai ficando bem freqüentado: pelo visto a Telemar também não quer que os seus clientes usem o telefone! Sim, pois o que mais se poderia deduzir de uma operadora telefônica que coloca obstáculos à obtenção de números de telefones por seus clientes?

Eu adivinho a origem desta aberração. É que a Telemar também, por incrível que pareça, padece daquela doença que observei no site do Submarino e que já está virando epidemia: a “síndrome do telefone submarino”. É a preocupação de tantas empresas em esconder ao máximo os números de telefone de atendimento a cliente para forçar os clientes a usarem a Internet em vez de ligar para elas.

E por que?, perguntaria a ingênua velhinha de Taubaté, aquela última que ainda acredita na inocência do presidente no caso do mensalão. É porque, respondo eu, a “lógica” do derrapante começa geralmente com esta maníaca obsessão em cortar custos, sem preocupar-se com o corte conseqüente na clientela que isto irá gerar.

Certamente, na Telemar, algum desses “executivos” metidos a “eficazes”, numa dessas reuniões insuportáveis que não têm hora para terminar, deve ter pontificado:

O custo do atendimento ao vivo está muito elevado… Salários, encargos e tudo o mais, de milhares de telefonistas: este item está onerando demais a nossa folha… Precisamos reduzir os custos do Atendimento… Precisamos direcionar os clientes ao nosso site, a fim de reduzir ao máximo as chamadas à nossa central… Sugiro passarmos a cobrar as chamadas para o 102, como forma de desestimular o uso deste serviço… Se os clientes quiserem falar conosco ao vivo, que paguem por isso… Aposto que assim vai reduzir o volume de chamadas e ainda vamos fazer este setor passar de deficitário a lucrativo”…  

Cansados de ouvir o discurso que, imagino, tenha sido mais ou menos assim, os demais participantes da reunião, loucos para irem embora tomar um chopinho no Botafogo, não devem nem ter pensado nas eventuais conseqüências negativas desta decisão e aprovaram a tarifa para dar informações aos clientes. Até mesmo esta mãe de todas as derrapadas: a cobrança de tarifa para dar o telefone do próprio número onde se dão as informações cobradas!

Não fosse o adiantado da hora, quem sabe alguma solitária voz de lucidez, que sempre existe em todas as empresas, tivesse se levantado e dito coisas assim: Estaremos com isso correndo um sério risco de desestimular o tráfego telefônico, gerando queda em nossa receita… Esta cobrança é extremamente antipática e talvez seja até ilegal: sugiro consultarmos o Jurídico… Não faz sentido desestimular o cliente a usar o telefone, orientando-o para a Internet: nosso negócio é a telefonia, não a Internet…

A Internet concorre conosco: vide a voz por IP que já nos obriga a repensar todo o nosso negócio…  

E houvesse lá um diretor de marketing que merecesse o título, este teria mandado todo mundo “pastar”, ou melhor ir tomar chope, após ouvir esta idéia de jerico. Sim, porque ele, o Marqueteiro com M maiúsculo, saberia que as centrais de atendimento, hoje na maior parte (e não por acaso) rebatizadas de Centrais de Relacionamento, não devem ser consideradas centros de custo e sim geradoras do principal benefício para a empresa, que é o “goodwill” dos clientes. Ele saberia que cada bom atendimento dado, cada informação prestada com boa vontade (sem cobrar por ela) ajuda a fidelizar um cliente, gera boa imagem e assim traz novos clientes. Ele saberia que cada oportunidade de falar ao vivo com um cliente que liga é uma oportunidade de ouro para cativá-lo, encantá-lo com a empresa. E que não apenas não se deve evitar que o cliente ligue, mas se deve estimulá-lo ao máximo a ligar para a empresa.

Fosse eu este diretor, pronunciaria um justiniano “está demitido” ao executivo que deu esta infeliz sugestão, reveladora de uma mentalidade mesquinha, totalmente alheia ao verdadeiro marketing. Sem contar que, se tal sugestão vingasse… imaginem a gozação com a Telemar… Opa! Quase esqueci de que esta loucura aconteceu mesmo e a Telemar já está no meu “paredon”… Em tempo: a Telefonica não cobra por esse serviço, por enquanto…