Livro das derrapadas no marketing

Não fale conosco

Colunista: Antonio Silvio Lefèvre – Edição 09/04/2007

Boa parte das derrapadas apontadas por leitores desta coluna diz respeito ao péssimo ou nenhum atendimento dos links “fale conosco” dos sites de grandes empresas, ou aos telefones oferecidos aos clientes para esclarecimentos, dúvidas, reclamações, sugestões, etc. De uns anos para cá, passou a ser visto como “marketologicamente correto” e mesmo imprescindível para as empresas mostrarem que têm um canal aberto com os clientes, freqüentemente batizado de “central de relacionamento” ou algo parecido.

Entretanto, a realidade crua e dura, percebida de imediato pelos clientes, é que, na maioria esmagadora dos casos, este canal aberto é apenas uma fachada, aliás uma falsa fachada, pois as empresas não dão nem querem dar, de fato, atendimento a esses contatos e nem querem ter “relacionamento” algum com os clientes, além de lhes fazerem vendas e o receberem os respectivos pagamentos…  Emails ou mensagens postadas pelos consumidores nesses “fale conosco” não têm retorno algum ou então recebem apenas uma resposta automática tipo “agradecemos o seu contato…. encaminharemos ao setor….. etc”, e fica tudo por isso mesmo. Raríssimamente algum cliente recebe uma resposta individual, específica para a pergunta que fez ou a questão que apontou – embora todos esperem por isso quando entram em contato.

O resultado desta prática é, no mínimo, uma enorme decepção por parte dos clientes. E, no máximo, uma grande sensação de revolta, quando o motivo do contato é uma reclamação sobre produto ou serviço ou a demanda de uma informação crucial, como o endereço de uma assistência técnica.

Tenho consciência de que, para muitas empresas, até pelo número enorme de clientes, seria simplesmente impossível dar respostas individuais a mensagens de todos eles e muito menos respostas rápidas. Mas conheço empresas que nem sequer cogitam dar respostas individuais por escrito, por considerarem que isto as comprometeria e poderia “produzir provas” na mão do cliente em caso de uma reclamação ir parar no Procon ou na Justiça… Preferem atender por telefone, acreditando que os clientes não tomarão a iniciativa de gravar as ligações, como as empresas mesmas fazem ou dizem que fazem…  Mas nem por isso deixam de oferecer o canal de contato por email… e a razão disso, por mais incrível que pareça, é “aliviar” as suas centrais de atendimento telefônico… reduzindo custos. Acreditam, talvez, que os clientes que escrevem em vez de telefonar sejam mais passivos… e esperam que os seus problemas se resolvam sozinhos ou que eles tendam a se esquecer dos mesmos sem que seja necessária a intervenção da empresa. Os clientes mais “bravos” ou insistentes acabam mesmo telefonando, pensam os executivos “de relacionamento” dessas empresas.

Esses comportamentos configuram uma enorme derrapada pois, ao frustrar os clientes, deixando de lhes dar atenção e atendimento rápido e eficiente, estão gerando descontentamentos, que por sua vez provocam a perda desses clientes para a concorrência e prejudicam a imagem da empresa, o que se traduz em captação decrescente de novos clientes. Quem atua no mercado consumidor e não colocou uma venda nos olhos, sabe bem que o atendimento exemplar de uma reclamação ou de um pedido de informação pode transformar um simples cliente num cliente ainda melhor e mais fiel — e este num propagandista espontâneo (e portanto verossímil) da marca.  E o não atendimento adequado faz deste cliente um inimigo, de quem se pode esperar tudo, inclusive o pior.

Dentro desta ótica, nada melhor para cativar o cliente do que a total transparência. Se o canal de contato oferecido for o email, que se responda (de preferência no mesmo dia) às mensagens dos clientes. Se for possível dar um atendimento imediato através de um chat, excelente. Mas se houver risco de muita espera ou muita limitação de horário, é melhor esquecer o chat.  E se não for possível dar respostas rápidas e pessoais aos “fale conosco” por email, é melhor deixar de lado este falso diálogo e atender exclusivamente por telefone.

Mas, neste caso, não adianta robotizar o atendimento! A automatização crescente destes serviços, que busca filtrar as ligações (e às vezes até encerrá-las) na base do “digite isso, digite aquilo” também é extremamente enervante e frustrante para o cliente. Que um ser humano atenda de imediato a ligação é o que espera o cliente. E se este ser humano tiver um mínimo de massa cinzenta, que ele mesmo digite o que for necessário para atender ao cliente ou repassá-lo, com apenas mais um contato, a  outra pessoa viva que seja capaz de dar a resposta ou a solução esperada por ele.

A moral da história é que melhor não prometer o que não se pode cumprir. E é melhor uma boa central de atendimento telefônica, humana e honesta, mesmo com limitações, do que um pseudo “fale conosco” na internet, onde só o cliente fala — ou do que uma pseudo “central de relacionamento” onde o cliente se relaciona apenas com computadores e corre o risco de acabar, isto sim, é cortando relações com a empresa.