Livro das derrapadas no marketing

Liberdade ameaçada
Colunista: Antonio Silvio Lefèvre – Edição 23/04/2007

Neste mês de abril estreou uma campanha online da Natura, com a assinatura da Lew Lara, que tem como foco “a liberdade do internauta frente às propagandas”. Segundo explicou o VP de criação da agência, em todas as peças de mídia eletrônica da marca haverá um botão que possibilitará o fechamento do banner, da mesma forma que já é feito com os pop-ups. Segundo ele, a idéia é transmitir ao público este posicionamento: A partir de agora é você que escolhe se quer ver a nossa propaganda.

Na opinião de um leitor atento às derrapadas, o publicitário especializado em interatividade Fabio Lacerda Flandoli, este “banner que fecha” é uma das maiores aberrações da Internet dos últimos tempos. Afinal, se propõe que o cliente feche algo que ocupa um espaço reservado. Porque o banner, ao contrário de dhtmls e pop-ups, não aparece sobre o conteúdo da página e muito menos sobre a janela do navegador. Portanto, quem tiver a infeliz idéia de fechar o banner verá um espaço em branco.  

A primeira pergunta que Fábio se coloca (e eu também) é: “Será que a campanha é tão ruim que o internauta vai preferir ver um retângulo em branco (ou preto) ao invés do banner?…” E a segunda pergunta é: “Já que o suposto benefício é a liberdade de escolha, ao clicar na peça, a pessoa nunca mais verá campanhas da Natura? Porque se for isso, dá para pensar numa utilidade…”.

Ora, conclui ele, o fato da agência criar algo que leva à conclusão de que um buraco é melhor do que um banner já é uma troca de valores. E o cliente achar que esse tipo de proposta possa ser um posicionamento de vanguarda ou de respeito ao consumidor é mais estranho ainda. Proponho o seguinte: por que a agência não faz o mesmo para o anúncio de TV? O telespectador decide se quer ou não ver a propaganda. Ah, me esqueci, já inventaram isso: chama-se controle remoto! E, na Internet, chama-se interatividade, via mouse. Alguém precisa contar para eles que, quando o internauta não quer ver uma campanha, ele simplesmente clica e sai da página.

Agradeço ao Fábio por suas sensatas palavras, mais oportunas do que nunca neste momento em que, para onde olhamos, só vemos atentados à liberdade de comunicação, travestidos de pseudo-proteção ao consumidor. É um prefeito, em São Paulo, que proibiu uma mídia inteira, o outdoor, sob pretexto de uma pseudo “limpeza” (em vez de limpar os bueiros que fazem alagar a cidade a cada chuva). É uma agência governamental que quer banir a propaganda de cerveja, para proteger a juventude, em vez de regulamentar a fabricação e venda do produto. São provedores de internet que censuram os emails de divulgação sob pretexto de proteger a “privacidade” do consumidor (em vez de protegê-lo contra golpes e vírus). É um ministro-jornalista que quer criar uma rede estatal de TV para veicular a “verdade oficial” em vez da imprensa livre.

Retomando os termos do brilhante e oportuno artigo de nosso colega José Roberto Whitaker Penteado na edição anterior do jornal Propaganda & Marketing, é importante ter cuidado para não fornecer munição aos inimigos da liberdade. Eles se apresentam como defensores da moral ou do bem-estar público; sabem sempre muito bem o que é bom para os outros e como os outros devem proceder. Como no célebre poema, começam colhendo uma flor do nosso jardim e, aos poucos, chegarão a arrancar as vozes de nossas gargantas.

Será que o JR está exagerando? Infelizmente não, concluo eu ao ler neste último domingo a reportagem sobre a ilha-prisão criada na Sibéria em 1933, com o sugestivo nome de Nazino, onde o “guia genial” da esquerda de então, Josef Stalin, abandonou os indesejáveis de sua época, condenando-os ao canibalismo e fazendo o seu arquipélago gulag parecer um resort.

E quem fornece essa munição para os inimigos da liberdade?, pergunto eu. Nos meios acadêmicos são os bobalhões que agora escrevem poemas exaltando a beleza oculta, que só eles vêem, da São Paulo “limpa” de propaganda, os puritanos e/ou impotentes que não querem ver mulheres bonitas tomando cerveja em suas TVs… e os info-neuróticos que se sentem invadidos em sua “privacidade” porque recebem um email de propaganda em vez de simplesmente apertarem a tecla Del.

E em nosso ramo publicitário os que oferecem munição são os “criativos” que têm vergonha da sua profissão, sentem-se culpados por fazerem essa coisa horrível chamada “propaganda” e por isso têm essa necessidade freudiana de estarem sempre negando o que fazem. Como aqueles da McCann que bolaram a peça mostrando como São Paulo ficaria linda sem outdoors e agora esses da Lew Lara que botam a propaganda no ar e pedem para o leitor tirá-la de lá…

Gente, se nem nós, que somos do ramo, defendermos a liberdade de comunicar e a função e validade da propaganda, quem mais defenderá? Vamos tomar muito cuidado porque, a continuar este clima, em breve a premiação publicitária vai ser um cruzeiro para alguma ilha tipo Nazino aqui do nosso litoral. Graciliano Ramos já passou uma boa temporada num “resort” da Ilha Grande… E é sempre bom lembrar que se a extrema direita não gosta da liberdade, aqueles que se dizem “de esquerda” gostam dela menos ainda… A trinca Fidel-Chavez-Morales que o diga. E o “nosso guia”, como diz o Elio Gaspari, vai à missa com eles…