Livro das derrapadas no marketing
“Estreou recentemente um comercial da Telefônica, que oferece a venda casada de três produtos e é estrelada pelos… Três Patetas!
“Esta merece o Oscar das derrapadas”, me escreveu um leitor publicitário, que acrescentou: Isto é de uma irresponsabilidade ímpar… vindo justo da Telefônica, que carece tanto de credibilidade, que tanto sofre com reclamações sobre suas patetices diárias!
Gente, quando será que certos “criativos” vão aprender que a função da propaganda não é fazer gracinha, mas explicitar os benefícios de um produto e destacar os atributos capazes de diferenciá-lo dos concorrentes? A “necessidade” de fazer piada a qualquer pretexto acaba levando a um total contra-senso como este: emprestar palhaços de uma outra era, desconhecidos da maioria da audiência, mas cujo nome, Os Três Patetas, só pode gerar associações negativas sobre o perfil do público desejado pelo anunciante com a sua oferta.
Com mensalidades “a partir de R$ 69,90”, o pacote da Telefônica promete ligações locais sem limite, TV por assinatura e internet banda-larga Speedy. Esta oferta é complexa e carece de explicações, para ter alguma credibilidade. Afinal, só por dizer “a partir de” o cliente já sabe que não deve ser bem assim… e por este preço. E uma infinidade de dúvidas surge de imediato em sua mente. Será que as ligações são sem limite mesmo? Será que incluem ligações para celular, as que pesam mais? A que canais de TV dá acesso? Qual a largura desta banda? O que acontece se a pessoa já tem algum desses serviços ou outro plano da operadora?
Daria para encher toda esta coluna com as dúvidas geradas por uma campanha que começa fazendo uma gracinha que é um verdadeiro insulto ao público-alvo e depois mostra uma família feliz por ter comprado um pacote que ninguém entende se é vantajoso ou não (e se é legal ou não, pois venda casada é proibida pelo código do consumidor).
Ligue e assine, diz o áudio do comercial, enquanto o vídeo apresenta, por 2 ou 3 segundos, um número de telefone. Mas como alguém pode ligar para eles e comprar um produto que não está explicado? Só mesmo um pateta iria comprar um pacote totalmente “no escuro”, como este. Pior ainda: a apresentação do telefone no vídeo é tão ridiculamente rápida que nem o menos pateta dos patetas teria memória para guardar o número ou tempo para pegar um papel e anotá-lo. Umas aulinhas de marketing direto não fariam mal a esses criativos, para aprender como se faz um comercial de resposta direta.
Talvez se aproveitando do que não é explicado nesta campanha da Telefônica, a concorrente Embratel saiu logo em seguida com um comercial, também metido a fazer piada com uma família de 21 membros e outras brincadeiras sem graça com o número 21, porém dizendo que, na oferta deles, não há nada “em letrinhas miúdas”… Ou seja, nenhum truque escondido na cartola do mágico, para engabelar os patetas do público-alvo! Só que a campanha da Embratel também não explica direito no que consiste a sua oferta. Não há letrinhas, mas as letronas não dizem nada e o comercial é só um (mau) espetáculo de circo.
Terceiro ato deste espetáculo de desinformação: no último domingo, 02/09, eis que o exemplar de Folha de S.Paulo de alguns assinantes da capital paulista chegou embrulhado por um folheto gigante do “Trio Telefônica”, com 1 metro por 70 cm de largura. Opa! Com todo este tamanho certamente devem vir as explicações das quais eu senti falta, pensei. Efêmera ilusão: com 99,9% deste enorme espaço ocupado apenas por fotos de gente feliz, no 0,1% restante vem este esclarecimento, em míseras 3 linhas de letrinhas: o Speedy é “light” (?), a TV é “essencial” (?) e os telefonemas são “locais” (?) E o preço? Ah, um bullet diz: “A partir de R$ 69,90… nos 3 primeiros meses”! E as letrinhas acrescentam: “Oferta válida (…) até 30/09/2007”.
Conclusão 1: não foi por falta de espaço que o comercial deixou de informar o que interessa, pois se em 1,4 m² de papel só botaram fotos certamente não é porque os redatores foram demitidos e só sobrou o pessoal da Arte. As letrinhas traem a verdadeira intenção do anunciante: fisgar rapidamente o consumidor pateta com uma oferta mal explicada, porque na verdade ruim, cheia de ressalvas – e esfaqueá-lo no 4º mês!
Conclusão 2: O resultado desta total desinformação da propaganda das operadoras é que um consumidor atento, que deseje avaliar ofertas e comparar vantagens e desvantagens oferecidas pelos concorrentes precisa fazer isso sozinho ou recorrer às colunas ou sites de defesa do consumidor.
A incapacidade (ou impossibilidade…) que têm certos publicitários de simplesmente explicar os produtos transferiu esta responsabilidade aos jornalistas, quando não aos advogados. Sim, pois estes publicitários, com sua obsessão por fazer gracinhas, escolheram para eles mesmos o papel de palhaços – e atribuíram ao público o papel de patetas.
Só que o consumidor de hoje não veste esta carapuça. Ele se informa, pesquisa, faz escolhas com o pé atrás e depois reclama nos jornais, no Procon ou direto na Justiça, forma grupos “Eu odeio isto”, “Eu odeio aquilo”. E, certamente não por acaso, a Telefônica é uma das mais odiadas pelos “patetas” que espera iludir com informações sumárias e ilusórias, embrulhadas com gracejos.