Livro das derrapadas no marketing

Responsabilidade social o quê, cara pálida?
Colunista: Antonio Silvio Lefèvre – Edição 27/11/2006

Está na moda. Milhares de empresas, de todos os portes e atividades, descobriram que fica “bem” dizerem que têm “responsabilidade social” e saem apregoando essas duas palavrinhas em slogans, anúncios e “programas” de todo tipo, verdadeiros ou falsos, inventados correndo para dar alguma credibilidade a esta afirmação. Institutos, entidades, ONGs e sei lá mais o quê se formam em torno desse modismo ingênuo, cópia carbono de bom-mocismos americanos “politicamente corretos”.

Está espantado com o que eu escrevi? Acha que eu sou contra as empresas terem responsabilidade social? Pois é, o que eu sou contra é fazer do óbvio uma “descoberta” e também contra a enganação que se esconde por trás de muitas dessas campanhas.

Óbvio porque qualquer empresa tem as suas responsabilidades, a primeira das quais é com os seus clientes, cujas demandas deve atender com eficácia, mas também e principalmente com ética, com correção, se quiser sobreviver e crescer. Porque se não fizer assim, o mercado, o mais sábio de todos os juízes, a condenará à morte.

Entretanto, o que vemos com espantosa freqüência entre nós são empresas “espertinhas”, fazendo de tudo para engabelar, quando não espoliar os seus clientes, numa postura predatória que nada tem de marketing, muito menos de ética.

Já desfilei muitos desses exemplos em minha coluna. São operadoras de telefonia que aprisionam e assaltam os seus clientes, são bancos, coligados em cartel, que impõe juros e tarifas exorbitantes ao mercado, são seguradoras que dão o calote nos segurados, é a fornecedora monopolista de energia elétrica que corta a energia dos clientes sem aviso prévio e por aí vai a lista, formada principalmente por empresas de grande porte, porque as médias e pequenas não têm estrutura, nem as costas quentes para montar essas verdadeiras arapucas contra os clientes e, digo mais, tendem a ser muito mais éticas do que as grandes, porque são empresas familiares e reproduzem os valores éticos daqueles que as dirigem.

E aí, o que vemos? Por cúmulo da ironia, por que não dizer da enganação e da cara de pau, são justamente essas grandonas “malfeitoras” que saem por aí regurgitando programas de “responsabilidade social”, patrocinando campanhas beneméritas, distribuindo cestas básicas, agasalhos, protegendo as espécies ameaçadas, se afirmando “amigas das artes” e todo um rol de “bondades” que, evidentemente, têm como única motivação fazer esquecer aquilo que elas realmente são e como tratam os seus clientes, imaginando que uma imagem criada artificialmente pela mídia irá ofuscar aquela gerada por sua prática, que é o oposto de “responsabilidade social”.

Todo empresário, principalmente o pequeno, sabe muito bem qual é a sua “responsabilidade social”: é conseguir manter a sua empresa viva e lucrativa (sim, porque lucro não é pecado, é necessidade) e, para isso, atender os clientes não apenas bem, mas com excelência, o que pressupõe, em primeiro lugar, fazê-lo com correção, botando a ética acima de qualquer outra consideração.

Sua contribuição ao “social” se faz pelo que ajuda a movimentar a economia, pelos empregos que oferece e, mais do que tudo, pelos exorbitantes impostos que paga. Impostos estes que, aliás, obrigam moralmente os governos a fazer o resto, ou seja, cuidar dos necessitados, dos ameaçados, animais e vegetais, e dar proteção aos indefesos consumidores contra a ganância dos poderosos e onipotentes, públicos e privados.

Fora disso, não tem o menor cabimento querer que uma empresa qualquer assuma funções que são do estado, ainda que sob o rótulo de “responsabilidade social”. Que cada um faça a sua parte, assumindo a sua responsabilidade específica: as empresas a de movimentar a economia, os 3 poderes a cumprir o papel que lhes determina a constituição, nem mais, nem menos.

É muito confortável para governantes corruptos terem um monte de empresas “socialmente responsáveis”, gastando no que eles deviam gastar, enquanto eles desviam o dinheiro dos impostos para não se sabe onde… Por isso é que esses programas de “responsabilidade social” encontram tanto respaldo público e até, por vezes, financiamentos oficiais, por meio de ONGs de “amigos do rei”, que ainda tiram uma bela casquinha de toda sua “responsabilidade”.

E por essas e outras é que, para mim, essa história de empresas ficarem apregoando “responsabilidade social”, ou “marketing social” é papo furado, sendo até compreensível que justamente empresas pouco sérias com seus clientes usem essas ações tipo “comportadas” como cortina de fumaça para esconder o desrespeito e a rapinagem com estes.

Gente, colegas empresários, vamos deixar essas bobagens e enganações de lado e fazer marketing a sério, com responsabilidade (e ética) com aqueles a quem devemos tudo: os nossos clientes. Que a responsabilidade pelo social propriamente dito seja exigida de nossos governantes e que estes, caso não dêem prova de possuí-la e praticá-la, sejam demitidos de seus cargos, nas próximas eleições..