Livro das derrapadas no marketing

Que Deus nos livre das operadoras, já que a Anatel não ajuda.
Colunista: Antonio Silvio Lefèvre – Edição 16/01/2006

Para esta coluna selecionei um case que me foi enviado pelo bom amigo e consultor baiano Enio Carvalho que, aliás, me precedeu na missão de apontar erros, com seu belo livro Marketing, Aprendendo com os Erros e Acertos (Makron, 1998). Com a diferença que nele os cases são apresentados sem dar nomes aos bois, como eu faço “corajosamente”, segundo o Enio. Pois bem, deixemos a coragem de lado e vamos ao seu “picante” relato.

Influenciado por uma mala direta que chegou às minhas mãos e cansado da Telemar, adquirimos da Embratel um telefone do seu novo produto chamado LIVRE, em fins de setembro passado. Eles nos disseram que teríamos que pagar adiantado R$ 99 pela aquisição do aparelho, que receberíamos em uma semana. E que por 700 minutos de uso pagaríamos apenas R$ 70 mensais.

Muito bem. No dia 4 de outubro veio a primeira frustração. Recebemos um aparelho igual a um celular, com nota fiscal da Vesper, dizendo que estavámos pagando por um Terminal Portátil Nokia 2272. Quando compramos pensávamos que se tratava de uma linha convencional com aparelho fixo. Isto não tinha ficado claro. Mas o pior veio a seguir. O tal aparelhinho, depois de devidamente carregado, não funcionava. Ligamos para a poderosa Embratel. Aquela burrocracia… e nada de solução.Tentamos falar com quem nos vendera. Disseram que não tinham nada com isto. Conseguimos um contato através de um revendedor da Claro (afinal Embratel, Claro e Vesper são tudo farinha do mesmo saco ). Ele nos colocou diante de uma pessoa da Embratel em Salvador. Ela, por sua parte, ligava e fazia reunião a três comigo e mais outra moça da Embratel, em outro lugar. E nada.  Já não quero mais este LIVRE. Quero me ver Livre da Embratel o mais rápido possivel. Eles não vão mudar. Vão continuar machucando os consumidores como fazia a estatal. Quero meu dinheiro de volta. E pensar que eu acreditei que um dia me livraria da Telemar !!! Não faça 21. Peça apenas seu dinheiro de volta.

Como vemos pela descrição do Enio e também pelos cases da Vivo e Claro que já apresentamos e, aliás, como acompanhamos pelas constantes queixas de clientes que aparecem nos jornais e pelos recordes de reclamações aos Procons, apontar derrapadas das telefônicas, fixas ou celulares, é a maior moleza. Todas elas, em maior ou menor grau, abusam do direito de terem ganhado uma concessão pública e terem uma agência reguladora leniente (quiçá cúmplice), a Anatel. Confiantes na impunidade, elas impõem sobre o consumidor toda sorte de enganações e em alguns casos, de violências, para que estes levem sempre a pior. A “última” da Anatel foi  anunciar orgulhosamente que os “pulsos” das fixas iriam ser transformados em minutos, para “beneficiar” os consumidores…. Mas a Maria Inês Dolci, a tempo, denunciou em sua coluna da Folha de S. Paulo (03/01/2006) que com isto as contas vão é subir, num mega tarifaço!

Quanto às operadoras de celulares, o que elas certamente consideram como sua “grande jogada” de marketing foi passar a vender aparelhos “com descontos”, vinculados às linhas… e assim amarrar os clientes graças àqueles abusivos “contratos de fidelização” (que deviam ser simplesmente proibidos).  A tal ponto esta jogada “pegou”, que hoje as pessoas até se esquecem de que, no início, a linha era uma coisa e o aparelho uma outra. Parafraseando o Enio, o cliente antes era realmente “livre” para  trocar de aparelho ou de operadora e hoje é engabelado por um pseudo-desconto no aparelho, pelo qual ele vai pagar muito mais em seu longo período de escravidão à operadora…

Numa visão predatória do marketing e achando que estão sempre levando vantagem, as operadoras estão é derrapando feio. Mas podem se preparar que a vingança dos consumidores virá muito em breve através da liberdade de falar propiciada pelas tecnologias voIP para fixos e celulares, voz e imagem. A livre concorrência mundial acabará muito em breve por oferecer opções que farão a clientela das atuais teles debandar em massa. Em minha casa eu já tenho há tempos um nº de telefone VoIP da California, através de uma operadora americana à qual pago US$ 25 mensais  fixos para ligar ilimitado para qualquer lugar dos USA. E de Los Angeles qualquer um me liga como se fosse uma ligação local. Com isso eu nem me lembro mais qual era mesmo o código da Embratel… a quem alimentei por tanto tempo com chamadas internacionais.

A receita é  “boca fechada e voIP”, como escreveu a Dolci.  Alguma esperança para as atuais teles brasileiras? Sim, se para salvar a pele, elas acabarem com as “fidelizações” e baixarem dramaticamente as tarifas ou se, de repente, por algum milagre, resolverem fazer marketing de verdade, a favor do consumidor, em vez de contra ele.